Os contatos do missionário com a realidade
missionária indígena.
Pr. Percio Coutinho Pereira
Atos 28.1-10
Introdução
1.O apóstolo Paulo era de Tarso, uma cidade universitária da época. O
convívio dele flutuava entre duas culturas: a judaica e a gentílica gregoromana. Ele não apenas conhecia bem as duas culturas, como fazia parte
delas.
2.Embora Paulo seja um padrão para o trabalho transcultural, só houve dois
lugares visitados por ele que eram considerados primitivos.
3.Um desses lugares foi a ilha de Creta. Ele mesmo não começou aquele
trabalho. Provavelmente, foram João Marcos e Barnabé na famosa separação
das equipes missionárias. Paulo nem mesmo trabalhou em Creta, mas enviou
Tito. E teve uma passagem muito rápida por ali. Até que ele quis ficar uns 4
meses, mas a tripulação do navio que ia para Roma não quis e quase
naufragaram (At 27.7-23). Mesmo assim, os cretenses tinham costumes de
piratas, mas foram colonizados pelos gregos há 1500 anos antes de Cristo.
4.Outro campo missionário transcultural para Paulo foi a ilha de Malta. De fato,
este foi o único lugar que Paulo visitou que podemos afirmar que se tratava de
cultura diferente da cultura judaico-grego-romana que Paulo tão bem conhecia.
5.Não foi uma visita programada, nem uma viagem missionária. Mas foi o
resultado do naufrágio daquele navio cheio de prisioneiros.
6.Por um lado podemos dizer que Paulo chegou acidentalmente (naufrágio),
mas por outro lado devemos crer que foi a providência divina que o lançou ali.
7.A chegada de Paulo na ilha de Malta serve de inspiração e modelo para o
trabalho missionário indígena.
8.A começar pelo acesso, chegar até à ilha de Malta era um desastre (At
27.41-28.1). Os trajetos para alguns trabalhos missionários indígenas são
sofríveis (Exemplo: Foz do Içana).
9.O trabalho transcultural antes de tudo é um contato com uma outra realidade.
Para o missionário recém-chegado pode não parecer real, mas é que a
realidade é um tanto diferente da realidade que ele está acostumado.
Proposição: O candidato ao trabalho missionário deve se preparar para o
contato com outra cultura. A estadia de Paulo na ilha de Malta dá um vislumbre
do contato do missionário com o campo de trabalho futuro.Oração Transitória: Os contatos do missionário com a realidade missionária
indígena.
I. O contato com bárbaros - v.2
1.Há uma forte campanha para evitar termos como estes, mas sempre
existiram culturas de costumes primitivos, menos desenvolvidas em relação ao
desenvolvimento normal do mundo. São os chamados “povos isolados”.
2.Os gregos apelidaram esses grupos de bárbaros, pois como não falavam
grego, a língua oficial, tudo o que falavam aos ouvidos dos gregos soava como
“bar bar”, como uma criança articulando as primeiras sílabas.
3.O termo se generalizou até chegar aos nossos tempos. A discriminação não
está propriamente no termo, mas em considerar-se mais humano do que esses
povos.
4.Alguns povos isoladas são bravos. O saudoso missionário Abraão Koop, da
Missão Novas Tribos dizia que os Paacas Novos receberam os primeiros
missionários com flechas. Assim foi com a tribo Sawi na Papua Nova Guiné,
cuja história é relatada no livro “Senhores da Terra”.
5.Os primeiros missionários da New Tribes Missions foram mortos pelos índios
Ayoré da Bolívia. As cinco viúvas continuaram o trabalho e viram os assassinos
de seus maridos se converterem.
6.Antes da Missão Novas Tribos, três ingleses vieram para o Pará fazer contato
com os Kaiopó. Os três foram mortos. Foi escrita a história, não traduzida para
o português, desses três jovens. O livro se chama “Os três Freddys”, pois
tinham o mesmo nome e a mesma convicção. Isto foi em 1927.
7.Nem todos os bárbaros, ou povos isolados, são hostis. Os missionários das
Novas Tribos se preparam para um contato difícil com os Zo’é (na época os
Poturu). Para a surpresa de todos o contato foi pacífico. Mais hostis foram os
antropólogos que expulsaram os missionários da tribo.
8.O contato com os bárbaros da ilha de Malta foi tão pacífico que eles nem
queriam os pertences das pessoas, mas pelo contrário, cuidaram deles e de
suas necessidades físicas (v.2).
9.O missionário terá, portanto, contato com pessoas de verdade, amigos de
verdade, mas de costumes e maneiras de civilização, às vezes, totalmente
diferentes para ele.
II. O contato com animais peçonhentos – v.3
1.É impossível negar a realidade de que o missionário encontrará cobras no
campo. O Brasil é um país tropical e tem as mais belas e perigosas variedades
de cobras. Em Minas Gerais ver cobras é comum; em Mato Grosso matar
cobras é comum; no Amazonas ver e matar cobras é inevitável. 2.Daniel Royer, professor no Instituto Missionário Shekinah, em 1988: “Se o
medo dominar a pessoa, ele deixará de comer milho por medo de cobras”.
3.Todos os missionários já foram protegidos de picadas de cobra sem mesmo
o saberem. Não existem só as cobras que vemos; aquelas que passam antes
de nós ou aquelas que chegam depois de nós, também são reais. Os anjos
protegem os missionários, também, das cobras. Criancinhas são protegidas por
eles muitas vezes. Se algum missionário ou filho for picado não significa que os
anjos dormiram, mas que Deus por alguma razão quis que aquilo acontecesse.
4.Índios são picados por cobras. Os missionários já foram picados por cobras.
Ambos são humanos e as cobras não fazem distinção.
5.O missionário Bill Moore entregou ao Senhor sua filhinha de cinco anos. Uma
surucucu foi o instrumento de Deus para levar a criança. Élden, filho do
missionário Coy, foi picado por cobra.
6.Os animais peçonhentos, insetos perigosos e outros animais são uma
realidade do trabalho missionário. O missionário terá contato com esses
bichos.
III. O contato com as crendices do povo – v.4-6
1.O missionário poderá ser visto, às vezes, como um intruso e coisas erradas
que, porventura, acontecerem na tribo podem ser atribuídas à ira dos espíritos
sobre o povo por causa do missionário (v.4).
2.A tribo Maku guarda o costume milenar de proibir que mulheres vejam o rosto
do homem que usa máscara em uma de suas festividades. A penalidade para
tal ato é abrir uma grande cova, entrar toda a aldeia dentro e colocar fogo para
que todos morram. Os missionários não estão isentos de serem a “maldição” e
tampouco estariam livres da penalidade.
Outros exemplos
Índios que se abaixam na canoa ao chegar perto de uma montanha com um
filete de água. Explicação: É a urina de um demônio que escorre pela
montanha.
Índios que saem para o meio da selva uma vez por ano e depositam alimento
em cima de uma pedra. Explicação: Alimentando os espíritos que poderiam
fazer mal à aldeia.
Na China os velhos são venerados e depois de mortos adorados e invocados
{ver NIDA, pg.41}
Já os esquimós exterminam os velhos, colocando-os numa jangada e
mandando para as águas gélidas para morrerem {ver NIDA, pg.41}
Muitas culturas não toleram o segundo gêmeo e matam apaziguando os maus
espíritos.3.Os povos estão cheios de crendices. Os nativos da ilha de Malta receberam
bem Paulo, mas ao ser picado pela cobra viram-no como um assassino sendo
perseguido por forças sobrenaturais.
4.Todo missionário aprende a desenvolver um estudo de cultura chamado “Os
Universais”. Cada aspecto da cultura deve ser observado e anotado pelo
missionário. Mas ao começar a anotar as crendices o missionário logo vê que a
tarefa é imensa. As crendices deles vão de um extremo para o outro. No caso
dos maltenses Paulo ou era um homicida ou um deus (v.5-6).
5.O missionário deve ficar atento, pois este é o contato mais sério e difícil dos
povos explicarem. É o contato com suas crendices.
IV. O contato com chefes de aldeia – v.7
1.O missionário deve se apressar em fazer um bom contato com chefe da
aldeia. Isto não significa que será o líder da igreja, mas para ter liberdade de
trabalho o missionário precisa ter a aprovação do chefe.
2.Paulo foi bem recebido e ganhou três dias de hospedagem com o chefe da
aldeia (v.7).
3.O candidato à obra missionário precisa aprender a respeitar as autoridades
desde já, pois seria o fim de seu ministério se não aceitasse a autoridade de
um chefe de aldeia e ultrapassasse as suas instruções. É um contato que
precisa de treinado desde já. Aprender a obedecer sem questionar.
V. O contato com doentes – v.8-9
1.O candidato ao trabalho missionário indígena faz coisas que dificilmente faria
em nossa sociedade. Nem mesmo seria prudente e legal, ou seja, tratar dos
doentes.
2.O curso de enfermagem será muito útil, mas nem todos podem ser
enfermeiros. A equipe ideal é aquela que tem pessoas com várias habilidades.
3.Mas de qualquer forma, os doentes são uma realidade para o missionário. O
amor pelos perdidos deve se estender para o cuidado com a sua saúde. As
coisas mais básicas para nós são incomuns para muitos índios. Por exemplo:
fazer um índio tomar comprimidos por 15 dias. Ou o missionário aplica injeções
ou cuida do índio como cuidaria de um filho: acorda para dar remédio e faz
uma escala para levar o tratamento até o final.
4.Agora multiplique isto por 100, 150, 200 ou mais pessoas. E quando a aldeia
é acometida por uma epidemia? E quando há casos em que é necessário
pagar um vôo de emergência? Lembre-se que a Missão não custeia remédios
e nem viagens. E não poucas vezes o missionário presenciará a morte de
crianças e adultos. Outras vezes será acusado pela morte deles por tirar do
curandeiro para tratar com remédios.5.O candidato deve desenvolver a prática da oração pelos enfermos e deixar
de pensar só em si. Paulo teve contato com um doente na ilha de Malta (v.8-9).
Lembre-se que Paulo era doente e estava indo para a prisão e saído de um
naufrágio, mas no momento não estava se lamentando, porém, pensando nos
outros.
6.Um contato certo que o missionário terá de enfrentar, é o contato com
doentes e alguns deles com doenças contagiosas.
VI. O contato com a honra – v.10
1.Talvez o contato mais perigoso que o missionário terá de enfrentar não é com
índios bravos, com cobras, com as crendices, com o chefe ou com doenças
contagiosas, mas o contato com a honra.
2.A humildade precede a honra, mas é possível uma outra ordem. Quando
missionários não são humildes o suficiente para receber honras, pode ser a
ruína deles.
3.Achar que pessoas não viveriam sem o nosso trabalho é a pior arrogância do
missionário, pois com tal atitude ele está menosprezando os seus
companheiros de ministério e a Deus que Lhe dá capacidade para trabalhar.
4.Paulo foi honrado pelos maltenses e até recebeu oferta deles. Mas Paulo
chegou naquela ilha por causa de um naufrágio, foi usado por causa da
misericórdia de Deus e saiu dali com as honras que deveriam ser devolvidas a
Deus assim que entrasse de volta para a embarcação.
5.Cuidado com o contato com a honra. Quando o missionário fica mais
conhecido, ele deve manter a mesma atitude humildade daquela com a qual
começou a sua carreira.
Conclusão:
1.A vida do missionário é uma vida de contato. Os contatos são reais, porém,
uma realidade diferente da sua própria.
2.O contato com povos primitivos (bárbaros). O contato com animais perigosos
(cobras). O contato com as crendices do povo. O contato com chefes de aldeia.
O contato com doentes (e doenças contagiosas). O contato com a honra.
3.O preparo missionário ajudará a amenizar o choque desses contatos e a
dependência de Deus fará possível esses contatos.
{NIDA} Costumes e Culturas – Uma introdução à Antropologia Missionária –
baseado na obra de E.A. Nida – 1954 – 2a edição em português 1988 –
Edições Vida Nova
Pr. Percio Coutinho Pereira, março de 2002
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